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05-12-2010 17:40

 Edição do dia 10/11/2010

10/11/2010 09h10 - Atualizado em 26/11/2010 07h13

Anajás (PA) tem quase metade da população com casos de malária

A cidade na Ilha de Marajó com 25 mil habitantes tem 10 mil casos de malária só na primeira metade do ano. A doença mata, maltrata e ameaça o futuro de milhares de brasileiros desde os primeiros anos de vida.

Marcelo CanellasAnajás, PA

Você conhece, mas ninguém fala dela. Está perto da sua casa, do seu trabalho, da sua família. É doença do silêncio. Em mais uma série especial do Bom Dia, os repórteres Marcelo Canellas e Luiz Quilião cruzaram o país para mostrar os efeitos da tuberculose, do mal de chagas e da malária.

Na África, a malária ainda mata três mil crianças por dia. No Brasil, está concentrada na Amazônia. Em 2009, foram 300 mil casos. No primeiro semestre deste ano, mais de 120 mil. A malária mata, maltrata e ameaça o futuro de milhares de brasileiros desde os primeiros anos de vida.

No calor equatorial da Amazônia, a sensação é de que o corpo congelou. “É um frio que parece que vai quebrar os ossos”, diz um rapaz. Ele estica o braço para mostrar o tremor da doença. “Muito tremor, febre, dor de cabeça, dor nas costas”, relata.

O exame é só para confirmar o óbvio. “Já tem o diagnóstico clínico de malária. Não adianta (dar o cobertor para ele). Nenhum cobertor vai curar isso”, diz o Dr. José Maria de Souza, do Instituto Evandro Chagas que estuda a malária há quase 50 anos.

Todos os dias, dezenas de pacientes prostrados e febris esperam para ser atendidos por ele no ambulatório do Instituto Evandro Chagas em Belém. “Começam os sintomas hoje em que se incluem a febre. Passa um dia sem febre. E dá febre no outro dia. Ou seja, 48 horas”, aponta o médico.

No Brasil, são três tipos de malária: vivax, falciparum e malarie. Todos são transmitidos pela fêmea do mosquito Anáfloes que pica a pessoa e introduz o parasita. É um protozoário que circula no sangue e destrói as hemácias, os glóbulos vermelhos. “Em 48 horas, rompe a hemácia, joga no sangue substâncias tóxicas que produzem esse fenômeno: febre, frio ou cale-frio, e muita dor de cabeça”, destaca Dr. José Maria de Souza, do Instituto Evandro Chagas.

Este ano, o número de testes positivos de malária no ambulatório aumentou em 50%. “Na Amazônia como um todo, aquilo que a gente esperava que 2009 para 200 e poucos mil ultrapassou a casa dos 300 mil”, afirma o médico.

O Brasil conseguiu a façanha de reduzir a malária de 10 milhões de casos anuais em 1940 para 50 mil em 1970. Mas a doença voltou com força, quando os governos da ditadura militar iniciaram os projetos de colonização da Amazônia.

“O que existia de malária nos anos de 1960? Alguns milhares de casos de malária na Amazônia. O que aconteceu com a penetração do homem e a alteração do meio ambiente, a fronteira agrícola que se expandiu? O número de malárias passou de alguns milhares para quase 500 mil casos de malária na década de 80”, explica o infectologista Luiz Hildebrando Pereira da Silva.

O Grupo de Controle da Malária do Ministério da Saúde, criado em 1999, conseguiu reduzir o número de casos para 300 mil por ano. “Na ilha de Marajó, teve um pico de malária importante. Por quê? Por causa da atividade econômica novamente. É o homem que penetra certas áreas e aumenta muito a sua participação, aumenta a degradação ambiental, aumenta a produção de mosquito. Novamente, picos de malária”, afirma o infectologista Luiz Hildebrando Pereira da Silva.

Um carro leva doente do Marajó. A prefeitura da cidade de Anajás mantém uma casa na periferia de Belém para que eles se tratem na capital. “Todas as semanas chega gente com malária. Vem gente de barco. Vem gente de avião”, conta a coordenadora da Casa de Apoio, Maria Mesquita Soares.

Encontramos 60 pessoas em uma casa de oito cômodos. Alguns tiritando de frio. “Esse nunca pegou malária antes. É a primeira vez. Ele está com febre, todo enrolado, com frio”, diz a coordenadora da Casa de Apoio, Maria Mesquita Soares.

“É muita malária. Tem pessoas que passam uma semana, tomam pílula e está de novo com a malária”, aponta o catador de açaí Eliel Furtado.